Para quem acompanha conteúdos de apostas esportivas, é bem comum, eventualmente, deparar com algum criador de conteúdo comentando sobre como apostar em todos jogos de uma competição num mesmo mercado acabou sendo rentável. Mais recentemente, isso se refletiu a mim na última Copa do Mundo do Qatar, no qual levantaram que, caso você apostasse na vitória do time mais fraco em todos os jogos obteria um retorno imenso em unidades.
Bem, se fosse simples assim ganhar dinheiro com apostas, seguindo apenas um método linear como esse, certamente as casas de aposta criaram formas de impedir isso, certo? Não sei. E por não saber, resolvi aproveitar que o ano de 2024 vai contar com todos os continentes tendo competições continentais no mesmo calendário para testar esse tipo de método. Aproveitando que, durante janeiro a fevereiro, aconteceram simultaneamente a Copa da Ásia e a Copa das Nações Africanas, fiz o que todo apostador sério deve se acostumar a fazer: planilhar entradas e resultados.
Para tal, é preciso estabelecer alguns critérios a serem aplicados comumente nas entradas. No meu caso, as entradas tinham as seguintes características:
- Linha mínima de AH +0,25 com odd mínima de 1,800;
- A entrada deveria ser feita o mais cedo possível, vários dias antes do jogo;
- As entradas deveriam seguir o mesmo padrão de stake;
- Separar entradas em fase de grupo e fase mata-mata.
Enfim, com o término das competições sagrando, curiosamente, ambos os países-sede dos eventos, trarei os resultados obtidos e tentarei analisar alguns fatores que podem ter sido determinantes, assim como algumas estratégias e razões por trás do levantamento.
Primeiramente, o balanço geral do estudo resultou nos seguintes resultados:
95 unidades de aposta investidas, com um retorno total de 104,40 unidades, resultando num lucro de 9,40 unidades e um ROI de 9,89%.
São resultados excepcionais se considerarmos que o método aplicado sequer considerava análises específicas dos matchups, de mercado ou de valor, atendo-se, literalmente, a fazer todas as entradas que, como falamos anteriormente, enquadrassem-se no AH+ mínimo.
Os dados especificamente de cada competição:
COPA DA ÁSIA
Ao todo, foram feitas 49 entradas na Copa da Ásia, sendo 35 na fase de grupos e 14 em mata-mata; o retorno total foi de 58,13 unidades, gerando um lucro de 9,13 unidades, com um ROI de 18,63%.
Na fase de grupos, 5,72 unidades de lucro em 35 investidas, um ROI de 16,34%;
Na fase mata-mata, 3,41 unidades de lucro em 14 investidas, um ROI de 24,35%.
COPA DAS NAÇÕES AFRICANAS
Ao todo, foram feitas 46 entradas na Copa das Nações Africanas, sendo 33 na fase de grupos e 13 em mata-mata; o retorno total foi de 47,25 unidades, gerando um lucro de 1,25 unidade, com um ROI de 2,71%.
Na fase de grupos, 6,18 unidade de lucro em 33 investidas, um ROI de 18,72%;
Na fase mata-mata, -4,93 unidades de prejuízo em 13 investidas, um ROI de -37,92%.
Valores totais por fase:
- Grupos: 68 unidades investidas, lucro de 10,92 unidades, com ROI de 16,05%;
- Mata-mata: 27 unidades investidas, prejuízo de -1,52 unidade, com ROI de -5,62%.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
Inicialmente, vamos às primeiras observações a serem extraídas dos dados acima:
O questionamento primordial a ser feito sobre qualquer método é: qual a sua validade? A forma aplicada no estudo acima apresentaria duas questões bem óbvias:
a) O quantitativo de entradas é o suficiente para definirmos padrões de entrada?
b) Os dados levantados teriam aplicabilidade para as demais copas continentais porvir?
Sobre “a”, não serei demagogo: não há. Para se extrair padrões, é necessário centenas, até milhares de entradas para se permitir a ocorrência de desvios, “bad e good runs”. No entanto, isso é inócuo no cenário observado, já que competições continentais de seleções são marcadas justamente pela natureza “tiro curto”, não se estendendo por mais de um mês e no máximo em apenas 6 jogos àqueles que forem mais distantes no torneio. Não dá para levantarmos dados dessa natureza num quantitativo ideal.
Quanto a “b”, há de se considerar o dito em “a”, mas é importante destacar que as competições africanas e asiáticas só se assemelham no regulamento idêntico, mas natureza, estilos de jogo e perfil dos jogadores são completamente distintos. Ainda assim, ambas obtiveram resultados lucrativos, com ROI muito próximo em suas fases de grupo. É um bom indicativo de que, talvez, haja realmente um mercado lucrativo em apostar em “zebras” em competições internacionais.
Feitos esses breves raciocínios, é hora de teorizar os porquês dos resultados:
- Linha de abertura: foi descrito no começo desse artigo de que as linhas utilizadas eram aquelas mais próximas possíveis da abertura do jogo. Por quê? Porque jogos entre seleções, embora não sejam necessariamente imprevisíveis, estão longe de ter a mesma previsibilidade que competições domésticas possuem, já que há uma falta de concretude quanto ao real desempenho esperado de cada seleção, seja pela falta de continuidade, por diferentes momentos de condição física de cada atleta, seja por mudanças de sistemas, ideologias e planos de jogo entre clubes e seleção, seja pela falta de confrontos recentes entre as equipes para traçar análise de matchups… enfim, o oddmaker provavelmente sabe mais do que eu ou do que você sobre os times, mas ele dificilmente sabe a ponto de quantificar precisamente a linha ideal. É o tipo de situação que o mercado vai ajustando nas imediações da partida, chegando numa linha, perto do kickoff, que seja mais próxima da fairline. Portanto, a linha com maior potencial de estar descompassada é justamente a inicial, e, nesses casos, a tendência é que seja favorecendo o favorito, pelo fator abaixo.
- Hype: competições internacionais sempre trazem consigo uma grande dosagem de ufanismo e visão hiperbólica. Isso acaba, inconscientemente, afetando também a percepção e a confiança de quem analisa os jogos, por mais que, conscientemente, não creia que o faça. Isso ficou perceptível na forma que seleções com alguns jogadores com mais “grife” recebiam linhas de favoritismo alargado, mesmo que, em campo, a atuação de suas equipes fosse bem deficitária e inconsistente com o estimado. Destaca-se que esse fator aqui é meramente especulativo por minha parte.
- Tiro curto: o aspecto de tiro curto relativiza, muitas vezes, a possibilidade concreta de que empates e que times satisfeitos com empate pareça algo crível. Todavia, sobretudo em competições como ambas analisadas, assim como a Euro, em que classificam 16 de 24 times, campanhas de 3 pontos em 9 disputados costumam ser suficientes para alguns times se classificarem. A própria Costa do Marfim, recém-campeã africana, classificou-se com essa pontuação, em 3º de seu grupo. O cerne aqui é que existe uma tendência a uma visão fatalista de resultados, em que um grande grupo de apostadores buscará a vitória do favorito ou a da zebra, ao passo que linhas de Handicap Asiático positivo possibilitam o retorno financeiro também em empates, que, como dissemos acima, muitas vezes é um resultado benéfico para até ambas as equipes.
Os resultados em fase de grupo foram muito consistentes e semelhantes em ambas as competições, já em mata-mata, tivemos uma grande divergência. Embora ambas as competições tenham sido marcadas por equipes favoritas jogando um futebol muito aquém do esperado, na África, na hora da resolução, as “mesmas” seleções vitoriosas dominaram os resultados, monopolizando as vagas finais (para reflexão, das 8 equipes nas quartas-de-final, 4 eram campeãs e 4 não. Elas coincidentemente se cruzaram, e as 4 vencedoras foram as já campeãs). Na Ásia, todavia, vimos um raro caso de zebras se consumando ou ao menos segurando o empate no tempo regulamentar, sendo eliminadas na prorrogação ou pênaltis (o que, para efeitos de Handicap Asiático, são irrelevantes, já que apenas o tempo regulamentar implica na aposta). Isso permitiu que, também na 2ª fase, a Copa da Ásia fosse lucrativa.
Em minha opinião, o cenário ocorrido na África tende a ser o mais natural. Há um motivo para poucas seleções terem vencido competições internacionais, e é algo que, para quem vê esses jogos habitualmente, compreende muito bem: a habitualidade. Seleções sem experiência habitual nesse tipo de situação tendem a ceder demais em momentos de pressão ou de decisão, com alguns erros crassos ocorrendo ao longo das partidas. Ainda, é possível que, com 3 jogos já em fase de grupos e um percepção mais realista das equipes, as linhas projetadas para o mata-mata já estejam mais adequadas, o que diminui a perspectiva de linhas vantajosas, ou dos fatores de “exagero” descritos anteriormente.
Antes de concluirmos, cabe relembrar que as entradas foram feitas sem análises profundas, atendo-se, somente, à condição de AH+ na linha pré numa odd mínima. É possível otimizar os resultados saindo de apostas obviamente ruins, seja pela conclusão de estudo do apostador, ao conhecer as equipes, seja pela variação prejudicial de odd (que é um dos grandes indicativos de que sua aposta é ruim). É sempre benéfico desenvolver métodos e achar formas de aprimorá-los.
Enfim, as conclusões que chegamos aqui é que, em fase de grupos, apostar nas linhas das zebras parece ter uma consistência lucrativa, algo que já merece muito mais atenção e análise cautelosa na fase mata-mata. Mas um ROI dessa magnitude, apostando em mercados asiáticos, é algo extremamente chamativo para ser interpretado como mero acaso. Vale experimentar nas próximas competições, claro, com moderação na stake. Em junho testaremos com as outras 3 competições continentais, todas concomitantes!